Muito se pode dizer a respeito de Lobão: um artista sardônico, assoberbado, versátil.Suas declarações polêmicas são arquitetadas com tamanha riqueza de detalhes e inteligência, que às vezes se tornam mais famosas do que sua obra.
Peguei o livro “50 Anos a Mil”, autobiografia do cantor com recheio de reportagens diversas, ávido por uma leitura que eu imaginava ser surpreendente. No final me surpreendi, realmente.
O livro não parece um relato biográfico, mas sim ficcional. São inumeráveis as loucuras da vida de João Luís Woerdenberg Filho, carioca de Ipanema, vítima da nefrose na infância e da epilepsia na vida adulta. “Sou um sobrevivente nato”, já disse Lobão numa entrevista antiga à Revista Playboy. E não mente: depois de passar por várias doenças raras, tentativas de suicídio, acidentes, é de se admirar que ele esteja vivo e saudável até hoje.
Filho de uma família de classe média, o cantor teve uma conturbada estrutura familiar. A mãe era bipolar e suicida em potencial, o pai era repressor. Tanto que, na cena em que deixa sua casa, Lobão coloca o pau na mesa: seu pai rola escada abaixo, ensangüentado, após receber várias violãozadas na cabeça, concedidas pelo filho de alento incipiente.
Em seguida, Joãoluizinho (epíteto carinhoso dado pela família) entra para o Vímana, banda de rock progressivo com Lulu Santos, passa rapidamente pelo Blitz e desemboca numa carreira solo regada à hits e drogas. O livro conta, inclusive, o antológico episódio em que o cantor foi condenado à prisão por um juiz que, segundo o narrador, era traficante e deu ordens para uma transação de maconha para dentro do país, durante o julgamento.
Passados três meses na prisão, o artista é posto em liberdade, no auge de sua carreira. É notável neste momento da narrativa seu relato a respeito da perseguição que sofreu a partir da mídia. Foi tachado de marginal e, revoltado, resolveu se passar como tal e morar com traficantes na favela. Nos anos 90 caiu no ostracismo, sendo rechaçado pelas gravadoras, o que impeliu-o a se reinventar como artista independente, situação que delongou-se até o lançamento de seu Acústico MTV.
O livro é composto por mais de 500 páginas, em prosa erudita e prazerosa. “50 Anos a Mil” é o retrato de uma geração, proferido por um artista que se localiza no interstício entre o histrionismo e o respaldo cultural, algumas vezes estando nos dois lugares ao mesmo tempo. O livro é uma leitura compulsiva (devorei-o no Carnaval, sem ter recursos pra viajar). Vide a posição que tem ocupado nos rankings de Best-sellers nacionais.
Arthur Viggi
Criatura desnecessária à música brasileira... lamento muito a sobrevivência dele aos tais episódios... prefiro calar minhas posições radicais sobre todos os temas, mas essa é uma pela qual tenho certo apreço: Lobão é um acidente/incidente musical, prolixo e babaca, ao qual, de coração, preferia não saber da existência.
ResponderExcluirBom texto, o problema é esse tema, já conversamos sobre o assunto.