segunda-feira, 26 de janeiro de 2015

O Anjo Pornográfico





Nelson Rodrigues é uma figura impregnada na cultura nacional. Considerado reacionário do ponto de vista político, mas revolucionário nos campos da moral, da intelectualidade, da arte e da sexualidade. Creio não ser recomendável passar por este mundo sem conhecer pelo menos um pouquinho de sua ousadia.

Sua obra é um escarro de originalidade. O teatro, como conhecemos hoje, foi inventado por ele. A dramaturgia, como espelho da sociedade, foi personificada por ele. Procure uma frase de Nelson e você encontrará um provérbio, tamanho o número de inferências que você poderá tirar dela.

Nelson era uma pessoa que se confundia com o personagem que criou de si mesmo. E, este por sua vez, se confundia com os personagens que criava nas crônicas e histórias. Nelson foi visceral, apaixonado. Não era boêmio, mas se embriagava de vida. Não era um depravado (ou se foi, era-o de forma saudável), mas usufruiu de sua sexualidade com a tenacidade de um anti-herói.




“O Anjo Pornográfico” é um livro fantástico. Ruy Castro, seu progenitor, parece ter nascido para retratar o biografado. Nostálgico por essência, o autor atingiu o clímax de empatia necessário à transcrição da figura humana de Nelson Rodrigues. O livro nos remete não só ao personagem de Nelson; antes de qualquer coisa, nos apresenta o cenário nacional do princípio do século XX, com a ascensão de Mário Rodrigues, o patriarca da família, à imprensa carioca.

Depois, nos faz mergulhar no contexto fraternal dos irmãos de Nelson, muitos deles também peculiares no meio jornalístico. A propósito, o livro tece com eficiência o retrato do grande Mário Filho, um dos maiores patronos do futebol brasileiro, figura que comercializou, popularizou, reproduziu, incentivou e catapultou o esporte.



A prosa despojada, aliada ao ferrenho trabalho de pesquisa desenvolvido pelo autor, derivou um grandioso trabalho que, como toda boa biografia, leva o leitor a pensar sobre sua própria existência. Não há resultado diverso quando se reproduz a essência de um ser humano, de forma detalhista e visceral, em seus vários papéis. Nelson Rodrigues foi filho, irmão, jornalista, dramaturgo, esposo, adúltero (como seus personagens), pai de família e transgressor de uma forma que muitos gostariam de ser (e eram) nos anos 50 e atualmente. A diferença é que, à época de Nelson, a sociedade rígida e moralista não estava preparada para que lhe jogassem na cara a libertinagem que se consente hoje em dia.

Arthur Antunes


domingo, 18 de janeiro de 2015

Auschwitz e o Café Corporativo




O relacionamento profissional é algo estranho. Os colegas de trabalho estão reunidos em equipe, em prol de um interesse comum. Mas isto não quer dizer que haja amizade entre eles. Aliás, não é nem recomendável que exista amizade no trabalho, por uma questão de bom senso. Eu me recuso terminantemente a me envolver com as pessoas no dia a dia profissional. “Boa tardes” e “tudo bens” já são bastantes. Polêmicas corporativas até caem bem de vez em quando, se você tiver empatia com o insurgente. Alguns comentários de corredor também são válidos. Mas amizade, amizade, não. Amizade e trabalho são como água e óleo. Os problemas de uma esfera afetam a outra decisivamente. Portanto, têm que ser separadas.


Lembro-me bem de meu primeiro emprego, num ambiente muito fraternal e descontraído. Havia um contingente de mulheres que compunham uma panela indelével. A panela, a propósito, era tanto figurativa quanto literal, pois uma das meninas era cozinheira e fazia almoços coletivos na cozinha, como numa república. 
Uma outra usava o telefone da recepção como um orelhão. Fazia longas DR’s e contatos pessoais. Havia também churrascos freqüentes de confraternização. Resultado: a fofoca comia solta; conflitos eram recorrentes; vi colegas cortarem relações por brigas mesquinhas.


Eu mesmo tive problemas, e quando mudei de emprego, 5 meses depois, senti um alívio emocionante. Agora adoto uma conduta anti-social, da qual me orgulho. Já auferi a fama de funcionário “que não dá idéia pra ninguém”. E sou respeitado por isso. Ou pelo menos criticado pelas costas, o que não deixa de ser uma forma de respeito. 
Existem, no entanto, momentos de sofrimento protocolar. E o maior deles é na hora do café corporativo. Vou até a cozinha por uma necessidade fisiológica. Tudo que eu desejo é comer meu pão com manteiga e sair fora. Mas acabo me deparando com brincadeiras, risadas, sorrisos envernizados e conversas clichê.


Se tem um momento em que me sinto uma puta, é no café corporativo. Sinto-me traidor de mim mesmo. Sinto-me um deputado do PMDB. Pois me rendo, afinal, aos protocolos corporativos. Devolvo os olhares, faço piadas incidentais. Abro sorrisos de botox, sou gentil de uma forma que não gostaria de ser. Eu converso.



O café corporativo é como Auschwitz. Não importa os que estão a sua volta. São todos kapos, soldados da SS ou judeus egoístas batalhando por uma ração diária de pão. E você tem que respeitar os comandos protocolares para ganhar o seu quinhão. Tem que se investir numa persona, quando o que realmente importa é apenas o pão com manteiga; a sobrevivência; a ausência de sociabilidade.

Arthur Antunes

quinta-feira, 2 de outubro de 2014

O tempo que é valioso



Vivemos um tempo em que o trabalho nos toma muito tempo. Nossa sociedade se acostumou com a ideia de que o certo é ficar até depois do expediente. Trabalhar 14, 15 horas por dia passou a ser motivo de orgulho. Muitos deixam suas vidas e dedicam as empresas uma parte muito grande de suas vidas, Quantas fotos compartilhamos dizendo que estamos até mais tarde no trabalho? Ou que hoje é dia de pizza na agência? Certamente não são poucas.

Por outro lado, aqueles que mantém uma firme postura com relação ao horário de trabalho muitas vezes são taxados de preguiçosos. São colocados em desconfiança quando apenas cumprem com aquilo que foi acertado. Pois normalmente, em qualquer entrevista de emprego, ninguém lhe dirá que você terá que ficar após o expediente e que isso é normal.

Vivemos ainda um conflito entre os orgulho workaholic e o final de semana. De um lado, o trabalhador orgulhoso de ter que ir a firma no final de semana terminar aquilo que não teve competência para fazer durante os dias úteis. De outro, a turma que reconhece no final de semana um merecido descanso. 

Difícil dizer quem está certo. O certo mesmo é que não somos máquinas. 

sábado, 21 de abril de 2012

Música Suja - Estudando o Samba


O ano era 1986. O cantor David Byrne, do extinto grupo Talking Heads, perambulava pelo Rio de Janeiro e, passando por uma loja de LPs, resolveu pedir alguns discos de samba para conhecer melhor o estilo. E graças à despretensiosa e providencial intervenção de um simples empregado, acabou levando um disco que o marcaria e, por conseguinte, mudaria para sempre a vida de Tom Zé.


 
Depois de ouvir “Estudando o Samba”, Byrne ligou para um amigo brasileiro que residia em Nova York e o interpelou a respeito de Tom Zé. Ficou surpreso ao saber que o músico era pouco conhecido no Brasil e rebateu: “Como é que o Brasil não conhece um artista desses?”. A partir daí, as estrelas da sorte se revelaram para o baiano que, a partir de David Byrne, foi divulgado internacionalmente e retirado do desmerecido ostracismo.


O disco não oferece um samba convencional. Em algumas faixas você até captura elementos do samba controvertido e clássico; contudo, eles são apresentados com a roupagem experimental peculiar de Tom Zé. O artista consegue contrapor erudição, densidade e hermetismo a melodias emotivas, letras grudentas e incrivelmente originais. Em sua quase totalidade, o álbum é composto por faixas nomeadas com monossílabos. “Mã”, “Toc”, “Vai”, “Ui”, “Tô”, “Se” e por aí vai.


Depois de quase duas décadas imerso no esquecimento, Tom Zé encontrou sua tábua de salvação neste maravilhoso trabalho. Experimentou um renascimento musical e passou a ser gloriosamente celebrado nos Estados Unidos e na Europa. Um sucesso de público e de crítica. Ele é mais um dos vários exemplos de artistas que, fugindo do mainstream brasileiro, só encontrou alento no exterior. Aqui no Brasil ele é maldito. Lá fora ele é Tom Zé.

Arthur Viggi

sábado, 14 de abril de 2012

Música Suja - Exile On Main St.

Sendo considerado pela crítica o melhor álbum dos Rolling Stones, não posso deixar de falar do antológico “Exile On Main St.” Foi sem dúvida o ápice da carreira da banda, demonstrando extrema maturidade musical e harmonia na combinação de estilos musicais. Você encontra nele elementos do jazz, blues, country, soul e gospel; uma aglutinação que resultou em Rock N’ Roll e Rhythm and Blues de qualidade.

A versão remasterizada do disco foi lançada há algum tempo atrás, disponibilizando as 18 músicas oficiais e mais algumas extras, com uma qualidade sonora que não deixa nada a desejar. O repertório se inicia com as frenéticas “Rocks Off” e “Rip This Joint”; passa pela clássica “Tumblin’ Dice”, a country “Sweet Virginia”;  e segue com a mesma fórmula em hits como “Loving Cup”, “Let It Loose”, “All Down The Line” e “Shine a Light”. Um disco magnífico, emotivo e, ao mesmo tempo, agitado.

 
Lançado em maio de 1972, o álbum não tem esse nome por acaso. Os integrantes estavam de fato exilados na França no período de composição e mixagem das músicas. Fugiam das alíquotas exorbitantes e da polícia inglesa. O processo todo de produção, inclusive as loucuras, aconteceu no palacete alugado por Keith Richards. O ambiente caótico de produção se refletiu no resultado final: uma mistura complexa, porém harmônica, de gêneros musicais.



Arthur Viggi

quarta-feira, 11 de abril de 2012

Música Suja - Músicas para Churrasco Vol. 1


Ele é seu amigo, seu companheiro, Seu Jorge. O carioca de Belford Roxo lançou há pouco tempo o álbum “Músicas para Churrasco Vol. 1”, disco de samba-rock com uma pitada de soul. Inspirado na teledramaturgia brasileira, o cantor criou vários contos musicados sobre personagens fictícios ou emblemáticos, típicos das comunidades suburbanas. 


O disco tem uma efusividade contagiante e, até, carnavalesca. Cumpre bem seu papel de animador de churrascos, contendo um repertório de poucos acordes, porém bem combinados. Seu Jorge repetiu a fórmula do penúltimo disco, “América Brasil”, que o fez estourar em sua terra natal, com os sucessos “Burguesinha” e “Mina do Condomínio”. Apenas causa-me estranhamento o contexto em que o artista se popularizou no Brasil. À época do lançamento de “América...”, o cantor já tinha gravado um disco na França, um ao vivo com Ana Carolina, um filme nacional de destaque (Cidade de Deus) e outro internacional (A Vida Marinha de Steve Zissou). 


Eis então que Seu Jorge lança os dois hits já citados, que considero duas de suas piores músicas, e o Brasil passa a conhecê-lo. Muito triste o fato de a maioria das pessoas só notar o que é easy listening. Mas, enfim, nada é perfeito. O cantor tem conseguido conciliar vendas com boas músicas. Aconselho você a ouvir o mais novo disco com carinho, e é claro que ele tornará seu churrasco especial. Ouça também os trabalhos mais antigos, como “Samba Esporte Fino” e “Cru”, álbuns mais voltados para MPB, que trazem o Nosso Jorge em sua melhor forma.

http://www.youtube.com/watch?v=MubPUt0F7_M&ob=av3e 

Arthur Viggi

terça-feira, 14 de fevereiro de 2012

Cinema Livre - Duas terça-feiras onze de setembro


O maior atentado terrorista da história foi o ataque às torres gêmeas? Não acredito, aliás, como fica claro nesse vídeo há oculto na história uma outra terça-feira muito mais sangrenta e cruel que a tragédia americana. Dores são dores e não devem ser comparadas. Mas historicamente é preciso refletir.



João Ninguém

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